Tantas vezes tenho a nítida sensação e a real percepção, de viver (n)uma história censurável, daquelas em que o senso comum mandaria se pudesse, contudo que apenas observa à distância, sem poder alcançar a minha cabeça pensante, o meu sentir sem máscaras, o meu desejo ajuizado. Uma história passada num mundo todos os dias pisado, porém atulhado de portas que poucos ousam abrir; certamente por falsos receios, vergonhas impostas (acredito que até a si próprios) e, inegavelmente, pela ausência de real cumplicidade (notória nas suas incompletas faces) para ir mais além; àquele algures encontrado pela minoria que, como eu, partilha mais do que horas bem passadas, entrelaçando-se num pensar e sentir contínuos e não somente contíguos, sem farsas, sem faz-de-conta.
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Tenho pois tantas e tantas vezes a percepção real e não apenas a sensação ténue, de confessar em silêncio recantos escuros e sombrios, pressentindo parte de mim já do outro lado. O lado que se aproxima cada vez mais. Como cada vez mais também permite que se tornem reais, instantes de tempo suspenso e cabeças perdidas. Ou achadas...
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Num lugar em que a consciência dos minutos desaparece;
O sentido do que é o resto que não nós, se esfuma;
Os olhos percorrem cada detalhe do corpo alerta que têm nos braços;
O cenário não mais importa, esquecido que foi o espaço terreno;
Os figurantes nada mais são que transeuntes chocados pela imaginação do pecado que em tudo vêem (sem sequer entenderem qual o seu real significado);
Os perfumes geram um híbrido inebriante, já sem essência masculina ou aroma feminino, antes único e cravado em todos os milímetros de nós;
E os sussuros... esses dizem apenas aquilo que os outros sentidos já adivinharam e contaram ao ouvido ou deixaram escrito a fogo na pele arrepiada.
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E que é, no fundo, tão simples: o desejo autêntico de estar ali, naquele exacto momento e espaço, contigo, num abraço perpétuo em que os dois contornos se esbatem e apenas um vulto se distingue no escuro, único, despretensioso; numa entrega que se sabe impossível sem a segurança e o amparo instintivos, não só mas certamente de especial forma, quando tudo o resto nos deita abaixo, esquecendo a singularidade que pauta a existência que levamos nos meandros desta cidade, desta gente que olha de soslaio sem saber o que perde...
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.Talvez tenha também, em momentos incaracterizáveis, uma névoa.
- O que acontecerá, quando apenas os dois que somos nós, entenderem e quiserem viver na loucura do desejo do nosso filme para maiores de dezoito, na sanidade das conversas sérias, nos silêncios à beira-rio, nos sorrisos ao amanhecer, na ambição sem fim destas duas vidas? Será a cumplicidade que se instalou bastante para continuar?
.E uma resposta, imediata.
- O mesmo que agora acontece. Porque vale a pena completar as nossas perfeições inigualáveis, com os detalhes que as diferenças deste eu e desse tu, enriquecem. Mesmo que se corra o risco de ter que explicar o inexplicável. Ou manter o mundo na ignorância. Tanto faz, sinceramente. Porque te conheço no escuro..